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Os casos que mancharam o mandato de Silva Tiago na Câmara da Maia

Foto do jornal Maia Primeira Mão

Caso da alegada fraude nas eleições

Em dezembro de 2017, o Ministério Público (MP) abriu um inquérito por suspeitas de fraude nas eleições autárquicas de 1 de outubro.

Logo após as eleições, a Coligação “Um Novo Começo” (PS/JPP) dirigiu uma participação à Comissão Nacional de Eleições (CNE), que, em 24 de outubro, decidiu, por maioria, com uma abstenção, encaminha-la para o MP.

A candidatura encabeçada pelo independente Francisco Vieira de Carvalho ficou a 2.140 votos de vencer as eleições e contestou a veracidade dos resultados oficiais, que deram a vitória à coligação “Maia em Primeiro” (PSD/CDS-PP), de António Silva Tiago.

Em causa estão irregularidades detetadas “em mais de 70 mesas de voto (num total de 104 mesas)”, factos que levaram a coligação que ficou em 2º lugar a pedir a recontagem de todos os votos.

Mas o pedido foi recusado pela Assembleia Eleitoral, maioritariamente composta por elementos afetos à coligação PSD/CDS, que alegou não terem sido deduzidos protestos ou reclamações nas restantes mesas, o que terá motivado uma queixa da coligação PS/JPP junto do Tribunal Constitucional.

Segundo Vieira de Carvalho, “podemos estar perante fraude nunca antes vista”.

Ainda de acordo com este vereador, “quase metade dos envelopes que continham os votos chegaram ao Tribunal da Maia sem estarem lacrados” e terá havido “uma diferença de 100 votos”  numa mesa de voto, “atribuidos erradamente ao PSD/CDS”.

Silva Tiago reagiu dizendo que “Portugal é um país de primeiro mundo onde as eleições são um assunto sério e que são auditadas e certificadas por entidades reguladoras e acreditadas para o efeito”.

O Bloco de Esquerda sabe que, pelo menos parte dos envelopes que chegaram ao Tribunal sem lacre e assinaturas, saíram das mesas de voto lacrados e assinados.

Na Freguesia Castêlo da Maia, onde se detetaram algumas das irregularidades mais graves, o candidato do Bloco de Esquerda Carlos Fernandes ficou a menos de 20 votos de obter a eleição.

 

Caso SMEAS

Em 23 de maio de 2019, os Serviços Municipais de Eletricidade, Água e Saneamento da Maia (SMEAS) foram alvo de uma busca da Polícia Judiciária (PJ), motivada por uma denúncia anónima.

Segundo veículado pela comunicação social, terão sido constituídos arguidos o diretor delegado do SMEAS e dois membros da administração do mandato anterior.

Numa nota publicada no Facebook, Vieira de Carvalho esclareceu estarem a ser investigadas “despesas de centenas de milhares de euros em compras de equipamentos e bens (telemóveis, computadores, canetas, etc.) e ainda com diversas despesas (refeições, hotéis, viagens, automóveis, etc.)”

Referiu ainda que foram apreendidos “diversos equipamentos e muitos documentos (referentes aos últimos 5 anos.)” e que foram constituídos arguidos a vereadora Ana Miguel Vieira de Carvalho, o ex-vereador Hernâni Costa Ribeiro e o diretor delegado Albertino Silva.

Em comunicado, foi dito pelos SMEAS que “a administração e os visados estão tranquilos e disponíveis para prestar todos os esclarecimentos que forem necessários”, que “o procedimento permanece em segredo de justiça” e que “este tipo de escrutínios feitos pelas autoridades é normal e fundamental para o bom funcionamento da democracia”.

Esta não foi a primeira vez que autarcas da Maia foram alvo de investigação pela PJ.

Em 2009, foram realizadas buscas domiciliárias às residências de Bragança Fernandes e Silva Tiago, ao edifício da Câmara Municipal, a empresas do ramo imobiliário e gabinetes de arquitetura, estando em causa uma investigação por suspeitas de favorecimento da autarquia a dois empreiteiros, a troco de contrapartidas, no âmbito dos processos de licenciamento do Centro Comercial Vivaci e do Hospital privado do Lidador. Nenhum dos autarcas foi constituído arguido.

Em 2013, Bragança Fernandes foi libado da acusação, pelo Ministério Público, de peculato de uso, por alegadamente ter usado uma viatura da autarquia para transportar a mulher até Viseu. O caso não chegou aos tribunais, tendo o processo sido arquivado na fase de instrução.

 

Caso Tecmaia

Em 17 de dezembro de 2018, em sessão ordinária da Assembleia Municipal, os deputados do Bloco de Esquerda votaram contra, com voto de vencido, a aprovação de uma proposta de assunção, pela Câmara Municipal, de uma dívida ao fisco de quase 1,5 milhões de euros à Autoridade Tributária da extinta empresa municipal Tecmaia.

Em 15 de abril de 2019, o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto (TAF Porto) condenou o Presidente António Silva Tiago e o vereador Mário Nuno Neves à perda de mandato por ilegalidades cometidas na subscrição da proposta de assunção, que na prática desresponsabilizava Silva Tiago, Bragança Fernandes e Mário Neves da obrigação de pagar a dívida, enquanto ex-administradores alvo de uma reversão fiscal.

A condenação resultou de uma ação administrativa intentada pelo partido JPP, na qual era também pedida a dissolução da Câmara e da Assembleia Municipal, bem como da perda de mandato de António Bragança Fernandes, Presidente da Assembleia Municipal, mas estes pedidos foram recusados pelo Tribunal.

Também a vereadora Emília Santos foi visada numa outra ação administrativa em que o JPP pedia a sua condenação à perda de mandato, alegadamente por ter beneficiado o companheiro Bragança Fernandes ao votar aquela proposta. Porém, o TAF Porto ilibou a vereadora, que consegui provar que não vivia em união de facto nem coabitava com ex-Presidente da Câmara.

Em 30 de agosto de 2019, na sequência de um recurso, o Tribunal Central Administrativo do Norte confirmou a decisão do TAF de condenação às perdas de mandato do Presidente e do então vice-Presidente da Câmara Municipal da Maia.

Inconformados, os autarcas condenados alegaram que o "todo este processo é kafkiano" e que se trataria apenas de uma “alegada irregularidade formal”, anunciando que iriam novamente recorrer, desta vez para o Supremo Tribunal Administrativo e para o Tribunal Constitucional.

O Presidente Silva Tiago terá mesmo dito “o que fiz, fazia de novo e não me arrependo”.

Em novembro de 2019, Supremo Tribunal Administrativo aceitou, execionalmente, apreciar o recurso dos autarcas condenados, o qual se encontra ainda pendente de decisão.

No mesmo mês, o Tribunal de Contas (TdC) emitiu um relatório de auditoria no qual concluiu que foram cometidas ilegalidades financeiras, por parte da Câmara Municipal da Maia, na autorização de pagamentos, através do orçamento camarário, de dívidas fiscais da extinta empresa Tecmaia, imputadas aos ex-administradores.

O TdC, confirmou, assim, aquilo já havia sido dito pelos Tribunais Administrativos, acrescentando que têm responsabilidades financeiras os vereadores que subscreveram a proposta de pagamento ou que a votaram favoravelmente em reunião da Câmara, bem como aos funcionários assinantes da ordem de pagamento e do cheque.

O relatório foi encaminhado para o MP, que está ainda a apreciar uma queixa do JPP contra aqueles autarcas, alegadamente pelos crimes de violação de normas de execução orçamental, recebimento indevido de vantagem, corrupção passiva, participação económica em negócio, abuso de poderes e peculato.

 

O que se pode concluir de todos estes casos?

Em primeiro lugar, é necessário referir que não há uma ligação direta entre todos eles, que os processos não dizem respeito às mesmas matérias nem estão todos na mesma fase processual.

Alguns dos processos encontram-se ainda em investigação e sob segredo de justiça, outros estão pendentes de decisões de recurso.

No entanto, as suspeitas lançadas sobre o executivo e autarcas do Município devem sucitar preocupações, não obstante o escrutínio público ser o maior das últimas décadas.

Recorde-se que foi a primeira vez, na história do Município, que foram lançadas acusações de fraude em eleições autárquicas e que os tribunais condenaram autarcas eleitos à perda de mandato.

Por outro lado, estes casos constituíram uma verdadeira “prova de fogo” para a imprensa local, que contrariamente ao que era habitual, se viu, em vários momentos, forçada a maquilhar notícias desfavoráveis para com o executivo, revelando ainda mais a sua inerente parcialidade e falta de isenção jornalística.

Dispondo de maiores recursos e de uma máquina de propaganda bem olegada, o executivo da Câmara Municipal beneficiou dos atrasos da justiça e das dúvidas lançadas sobre a legitimidade em agir dos partidos políticos, acabando por usar estes casos judiciais para atacar a oposição, acusando-a de “judicialização da política”.

O Bloco de Esquerda manter-se-á, no decurso deste mandato, atento e vigilante, aguardando serenamente a conclusão dos processos judiciais em curso e defendendo, como sempre defendeu, os interesses da população da Maia.