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O que lembramos e o que esquecemos

Passados 47 anos, passadas duas gerações, cabe-nos perguntar o que lembramos e o que esquecemos quando se comemora o 25 de Abril. Porque, passadas duas gerações, nem todos nos lembramos do mesmo, por esquecimento ou por conveniência, ou, até, porque não o vivemos, no caso dos mais jovens.

Os que, nos nossos dias, suspiram por ideais neo-fascistoides, por uma nova República à medida dos seus cacetes, e todos os dias enchem páginas, entrevistas e notícias nos meios de comunicação (para eles que suspiram sempre tão solícitos), esses querem mesmo que esqueçamos que o que caiu no dia 25 de Abril foi uma ditadura.

Que essa ditadura, em 48 anos, nos deu um país de quase analfabetos e muito poucas crianças a prosseguir estudos, de condições de vida e de trabalho miseráveis, de uma guerra sem fim, de centenas de milhar de emigrantes, um país sem esperança e sem futuro.

Queremos lembrar que os portugueses viram aumentar o número de escolas e universidades com o 25 de Abril; viram a criação de um Serviço Nacional de Saúde que é (mesmo que a má língua diga o contrário) um dos melhores no mundo.

Viram o fim da guerra, viram a criação do salário mínimo, viram o direito de voto tornar-se universal.

Mas 47 anos é muito tempo. Muitos dos ideais de Abril foram desvirtuados ou esquecidos, ao longo do tempo. Por gente que lhes faz homenagem um dia por ano, e os esquece o resto do ano.

A pandemia veio mostrar-nos como era importante o Serviço Nacional de Saúde, mas também as consequências de um financiamento deficiente do mesmo, e o florescimento de empresas privadas da Saúde, protegidas ao ponto de escaparem à sua requisição quando mais necessárias eram. É preciso que não esqueçamos, é essencial que nos lembremos sempre, que o SNS é absolutamente essencial ao nosso país.

É preciso não esquecer, é urgente lembrar que, em 47 anos, muitas das conquistas de Abril no mundo do trabalho foram sendo substituídas por leis que promoveram o trabalho sem direitos e uma precariedade extrema. Que as leis do trabalho de Bagão Félix, de Vieira da Silva ou do governo da troika promoveram esse estado de coisas.

E poder-se-ia continuar, falando da questão da habitação, ou do espalhar da pobreza, ou do aumento do desemprego, ou da degradação das reformas, por exemplo.

Mas pensamos que o essencial é o que dissemos no início: os ideais do 25 de Abril devem ser defendidos dos que dele apenas querem lembrar o que lhes convém e esquecer o que lhes dá jeito.

Esses ideais têm de estar presentes na resposta à crise humanitária que o país atravessa com esta pandemia. Estar presentes quando enfrentamos o problema dos refugiados e o dever de solidariedade que temos para com eles. Estar presentes quando enfrentamos a emergência climática.

E, finalmente, perante os novos saudosistas do 24 de Abril, lembrar e não esquecer o que foi dito, bem alto, nesse dia 25 de Abril de 1974:

25 DE ABRIL SEMPRE, FASCISMO NUNCA MAIS!

 

Maia, 25 de abril de 2021